Recentemente, o Supremo Tribunal Federal finalizou o julgamento do RE 576.967/PR, que declarou inconstitucional a exigência das contribuições previdenciárias sobre o salário maternidade. Em vista dos claros reflexos que a decisão gerará em milhares de empresas, trataremos de esclarecer aqui seus efeitos práticos.

I. Os efeitos da repercussão geral

A decisão foi tomada em um processo envolvendo a empresa Hospital Vita Batel S/A e a União Federal, sendo, em princípio, aplicável somente às partes. Por força da repercussão geral, é vinculante também aos juízes, alcançando as ações em curso e os novos processos.

Embora inicialmente não tenha efeitos contra a administração pública, não tende a ser por ela ignorada. Afinal, seria um esforço inútil autuar um contribuinte com algum fundamento que não poderia ser defendido judicialmente. Assim, no âmbito da União, foi criada a possibilidade de dispensa de contestação, cujas hipóteses, previstas em ato declaratório da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, passam a vinculá-la.

Nesse contexto, vale destacar o posicionamento do Ministro Gilmar Mendes, no sentido de que as decisões tomadas em repercussão geral vinculam a todos automaticamente, o que permitiria a compensação imediata (Info 886 do STF). Contudo, trata-se de entendimento ainda controverso no âmbito do próprio Supremo Tribunal Federal [1].

II. Perguntas e respostas

a. Já foi editado o ato para declarar a dispensa de contestação quanto à exigência contribuição previdenciária sobre o salário maternidade?

Ainda não. Em que pese a decisão do Supremo Tribunal Federal, o Fisco ainda pode autuar o contribuinte que deixar de recolher tais valores.

b. Eventual autuação pode ser facilmente revertida?

É um risco. Em caso análogo, envolvendo a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, o CARF considerou indevida a exclusão sem ordem judicial, não se vinculando ao precedente do Supremo Tribunal Federal[1].

c. A União pode recorrer da decisão?

Sim, ainda cabem embargos de declaração, para correção de eventual ponto obscuro, contraditório ou omisso da decisão, bem como para requerer a modulação de efeitos.

d. O que é a modulação de efeitos?

É um pedido para que a decisão passe a valer a partir de determinada data, por razões de segurança jurídica e excepcional interesse social. Na prática, visa-se impedir que o contribuinte se credite dos recolhimentos indevidos dos últimos cinco anos.

III. Como fica a situação do contribuinte até lá?

Diante do cenário exposto, apontamos três posturas cabíveis ao contribuinte:

  • A mais segura: ingressar com ação judicial para declarar seu direito de descontar o salário-maternidade da base de cálculo de tais contribuições e resguardar o direito dos últimos cinco anos.
    • Vantagem: sendo praticamente certa a obtenção da liminar, em razão da vinculação do Poder Judiciário à decisão do STF, a empresa não sofrerá riscos de ser autuada em razão do procedimento e ainda “congelará” o período dos últimos 5 anos.
    • Desvantagens: dispêndios necessários ao ajuizamento da ação judicial. Necessidade de aguardar o trânsito em julgado para fazer as compensações.
  •  O caminho do meio: começar a descontar as contribuições daqui pra frente e aguardar o trânsito em julgado da ação no Supremo Tribunal Federal para recuperar o retroativo.
    • Vantagem: aproveitamento parcial dos efeitos da decisão. Ausência de despesas com ação em juízo.
    • Desvantagens:Risco de autuação, dada a ausência de vinculação da Receita Federal aos julgados em controle difuso. Ademais, pode levar muito tempo até que a decisão passe a vincular formalmente a administração pública. Assim, as empresas que não ingressaram com ações judiciais somente poderão recuperar os 5 anos retroativos à data do pedido de restituição/compensação. Na prática, até que isso se defina, corre-se o risco de perder quantia relevante dos créditos.
  • A saída mais arrojada: iniciar tanto o desconto das contribuições daqui pra frente e retificar as GFIPs dos últimos 5 anos para recuperar os créditos anteriores, considerando plenamente aplicável a decisão do STF, com fundamento na mutação constitucional.
    • Vantagem: imediata utilização dos créditos e aproveitamento dos efeitos da decisão.
    • Desvantagem: risco de autuação, dada a ausência de vinculação da Receita Federal aos julgados em controle difuso. Em caso de modulação de efeitos, a empresa poderá ser autuada por recuperar indevidamente o crédito, eis que desamparada de ordem judicial.

Permanecemos à disposição para eventuais esclarecimentos que se façam necessários.

Danilo Martins Fontes

[1] Considerando o informativo 886 do STF (ADI’s 3.406/RJ e 3.470/RJ) incluindo Gilmar Mendes, quatro ministros apresentaram entendimento pelo Senado Federal ser encarregado de simplesmente divulgar a decisão do STF e que a eficácia vinculante é desde a decisão da Corte, Marco Aurélio foi contrário ao entendimento, 3 ministros não se manifestaram a respeito e 3 estavam ausentes. Além de também expor aplicabilidade apenas matéria especifica tratada em controle abstrato.

[1] Disponível em <https://www.conjur.com.br/2019-abr-10/carf-ignora-stf-decide-icms-compoe-base-pis-cofins>. Acesso em 14 ago 2020.

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